Vale dos Pinheiros

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Capítulo 11﹘Alice Através do Espelho

A verdade é que ela tinha detestado o livro. Precisou fazer um trabalho de escola e só leu a versão infantil, reduzida. Imagina se tivesse que ler tudo. Que tédio. Ainda bem que tinha suas coleções de livros de mistério para compensar. Só daquele autor sueco, tinha lido os quinze primeiros e aguardava os dois últimos serem traduzidos.
— Gostou? Tomou um susto quando sua avó perguntou sobre o livro nas suas mãos, “Alice Através do Espelho“.

— Não. Achei irritante. Ela confessou. — Para complicar, é cheio de enigmas e de poesias que não ajudam em nada. Essa falta de lógica, ou lógica de sonho, enigmas, rimas e poesias, nada disso funciona para mim.
A avó riu e balançou a cabeça:
— Claro que não! Por que você iria gostar? Você não vive no século retrasado. Não tem que entreter convidados recitando poesias ou tocando piano na sala de visitas. As poesias, as rimas são todas referências daquela época. A avó olhou a contracapa. — Lançado em 1871, em plena época vitoriana! Mas, com certeza, tem alguma coisa interessante e diferente sobre esse livro.

— No final, ela só estava sonhando, como no primeiro livro. Ela disse, suspirando.
Avó Tarsila foi cuidar de suas coisas enquanto Carolina ficou pensativa. Pousou o livro na mesinha ao lado do sofá e ficou pensando em como a história era confusa e um tanto sem sentido. Às vezes, Alice conseguia determinar o que gostaria que acontecesse em seguida e, às vezes, era surpreendida por reviravoltas mirabolantes sem nenhuma lógica. Ela então se levantou do sofá e parou na frente do espelho grande na sala de visitas e, olhando em seus olhos, teve que se perguntar:
— Será que entendi mesmo esse livro?
Carolina estava acostumada a ler os livros mais difíceis, seus primos contavam com ela para explicar muitas coisas, mas dessa vez, não sabia o que dizer sobre aquela história. Começou a tentar olhar por dentro do espelho, ver se descobria alguma diferença no cenário da sala que aparecia invertido.
— O que você ‘tá fazendo? Helena perguntou, pulando ao seu lado.
— Sei lá. Vendo o que tem na sala que fica dentro do espelho. Ela respondeu.
— Ah, ‘tá… Por causa do livro. Já acabou? Gostou? Helena perguntou.
— Sei lá. Às vezes ele é estranho e, às vezes, meio chato. Carolina respondeu.
— Então não gostou… A prima mais nova concluiu.
— Mas gostei de entrar pelo espelho, de ir pra outra realidade.
— Jura? Não pensei que o pessoal de antigamente tivesse esse tipo de livro. Multiversos? Universos paralelos? Não achei que fosse de ficção científica. De repente, você poderia me emprestar? Disse ela, ao ver que não era muito grosso, a versão reduzida.
— Pode pegar, mas não achei tudo isso. Ela está no sonho e, de repente, comanda tudo ou é surpreendida pelas coisas mais malucas.

— E todo sonho não é assim? Perguntou Helena, pegando o livro na mesinha. — Eu vou gostar! Disse a menina, correndo pro quintal. Queria deitar na rede.
Carolina continuou imaginando como seria a sala da vovó, do outro lado do espelho.